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domingo, 4 de novembro de 2012

Não consegui
gestar filhos da eternidade.
Abortei à todos.
Tumultuei meu túmulo
onde jamais irá jazer um só,
mas sim. milhares de vidas,
vidas minhas e dos natimortos.
Peles do meu corpo
De um espirito que já não goza,
mas hoje só esvai por meu corpo nu
sem pele, sem vida
e só com minha rubra carne
que implora por escapar
e clama de hediondas formas.
Assume teu rumo,
cria as formas que lhe são possíveis.
Transubstancia tuas energias
e tuas forças
Faz do mundo o teu mundo
por teus milhares de mundos

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Eu sou,
O que sou.
Mas nem em milhares de pedaços,
Eu conseguiria mostrar
Os tantos que existem em mim.

A vida
Arranhada e amarrotada
Já não cabe
em minha vida.

Preciso fazer
tantas outras
Por tantos meios
Por tantas vidas

Para sentir-se vivo
E o que há de vivo

sábado, 29 de setembro de 2012

Sobre ontem


Antes parecia haver algo de poesia, a agonia pertencia ao préstito dos homens e ao banquete dos demônios.
Vazio como a casa pegando fogo, como uma casca da fortaleza do oco. O que há de vivo é a minha tolice que sai por um rubor da face esquerda. Há sangue que não corre e muito menos escorre.
Quais proveitos faço do despotismo da felicidade? Inclusive a felicidade autoritária é infeliz.
Se quando venho do silencio, do que perturba, de uma dor e da vontade imediata de inexistência que como um ardiloso veneno e que escancara o ventre de uma desejosa solidão a qual parece ser mais possível de meu deleite. Mas só há eu em meu pensamento, já que não existem operações suficientes para fugir da solidão da alma.

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

(M)Eu falo de mim


Falo
Pelo falo
Pelos pelos
Pelos ouvidos
Pelos apelos
Pelos afetos
Pelos humores
Pelos odores
Pelo tato
Falo, digo, falo
Pelas paixões
Pelas línguas
Por tantos e de tantos eu's eu falo
Eu falo de mim
Mim é verbo
Pois onde se fez o verbo
Há, eu, deuses e universos.

Devir

Devir

Há um devir em mim,
E agora não há mais.
Pois só, talvez o sei,
Quando o coração de outrem
Bateu dentro do meu eu.

Experimentações.

terça-feira, 17 de julho de 2012

Agora no agora


Agora já não tenho sono
Agora já não tenho fome
Pra fingir ser poeta, me abandono
Já prefiro não ter nome

O minuto passa
O relogio come
Um olho é sono
O outro neurose

Um lado é derrame
O outro é cópia
A letra é fala
O peito é aperto

Que bate para o corpo
E quando ve o que envolve
Cai implorando "por todo sangue
que pulsei, devolve."

sexta-feira, 29 de junho de 2012


A felicidade e a tristeza.
Para Gibran, duas damas
Uma deitada na cama,
a outra sentada à mesa.

Estou no corredor,
no meio do caminho.
Em minha casa,
sem sono
sem fome.

Além do deserto,
O mar é a maior metáforas.
Além do mar,
O deserto.

domingo, 10 de junho de 2012

Receio
Que meu recheio
Já não encha,
Nem preencha
Tudo que eu anseio.

Mas 
Dá pra saber,
Do que é que sou cheio?
Já não consigo acreditar
Que só pode ser o meu recheio

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Rio,
Sorrio.
Só riso,
Liso.

Da boca emaranhada com o dente
Risível corria o rio
Do som da água sorria
Com cada pedacinho do rosto
Que todo o fluxo refletia.

OvO




Pai e mãe não conta por vergonha,
De onde vem o nenêm.

É mais fácil contar;
Que não é do vai e vem.

E sim, de qualquer forma que se ponha
Um ovo da cegonha.

sexta-feira, 18 de maio de 2012

V

a

                                                                                                                  Z


IIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIII


oooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooo









Os outros são sempre tão vazios.
Mas só digo isso quando estou cheio...
Cheio de vazio.

quinta-feira, 10 de maio de 2012


A palavra, só um dos redutos da expressão, só mais um dos estimulos da comunicação, tem uma textura anti ética.
Sendo só uma palavra, a dor por exemplo, perderia sua aspereza e seu uso acabaria se tornando descuidado.
Quando se faz poesia, torna-se experimento.


Salvemos boa parte da poesia, ácida e feroz. Pois, enquanto isso, dobramos e queimamos a nossa própria lingua.


A linguagem humana, por muito tempo sendo tratada como o principal diferencial da existência dos homens com as outras espécies,banalizou indiretamente a vida. Se fosse uma moeda, seria do mais puro ouro.
Porém, seu valor oscilaria constantemente entre altos e baixos na balança comercial do universo.


Creio eu que não é só com a carne que experimentamos expressões e sensações.

terça-feira, 1 de maio de 2012

Palavra alimento


Tem tempo que não tenho tempo.
E me falta ser sagaz,
Pra fazer de sustento.
E cada palavra um centavo,
Assim servir de alimento.

segunda-feira, 30 de abril de 2012

Pra lá, pra cá

Melhor não olhar pra minha mão,
Se aponta para lá ou pra cá.
Não confie no que ela diz,
Sei não, mas acho melhor você confiar
No teu senso de direção.

Mostra de lá a cá,
Mas não queira acompanhar.
Rápida do mágico é a mão,
Como a bala disparada do canhão.
E ando tanto de lá pra cá,
Que até parece que o chão vai afundar.

Pra lá!
Que pra um outro é cá.
É meu caminho pra ir,
Mas pra alguém é só o de voltar.

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Traçado bobo

Quando saio por aí,
Traço dois caminhos.
Um pra voltar,

Outro pra ir.

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Dormir

É piscar os olhos,
Mas não passam segundos
Correm horas.
É o tempo intenso,
Que a gente não vê passar

domingo, 1 de abril de 2012

Contrações

Pasmo fiquei
Assim que notei
O espasmo é aquele,
Pasmo no passado?
Ou pasmo no presente?

Pasmo por um espasmo

Ao ouvir que a Lua parecia estar mais próxima da Terra e no mesmo instante perceber que nem de longe ou ao lado da Lua poderia ter notado aquilo, como em um pequeno espasmo, ficou pasmo.

Concordou com a proximidade da Lua e logo em seguida passou para os rebuliços rotineiros que vivem a turbilhonar sua cabeça. Essa Lua de tão próxima lembrava o rosto de uma mulher naquela proximidade que existe antes de um primeiro beijo e que pode ser imperceptível.

O tempo fica por um instante breve e longamente imóvel, a relatividade dele é experimentada naqueles poucos segundos. A face daquela que será beijada parece estática e onde o único sinal de vida é o brilho dos olhos refletindo a luz do ambiente como se fosse um espelho ausente de prata, mas composto de uma textura que é visivelmente úmida e enternecida por vontade e de um desejo que só pode ser medido por aquele que também a olha. A aproximação parece lenta como os ponteiros do relógio que ficam tortos vagarosamente no seu eixo só para marcarem as horas, minutos e segundos. Tudo parece lento, mas também intenso.

Como a Lua em sua proximidade está envolta do negro do céu, tudo naquele instante também fica sem cor, mas enegrecido por culpa das pálpebras fechadas por dois desejos e dois desejantes, algo que normalmente acontece de forma tão abrupta que nem percebemos e temos a impressão de estarmos constantemente acordados e alertas para tudo que passa ao nosso redor. Os olhos parecem não se fechar no dia a dia. Tudo fica preenchido de volúpia, um sabor quente e umidificado se torna realizado e com um cuidado redobrado tudo se toca sem saber o que se espera dos próximos segundos, horas e dos outros encontros.

terça-feira, 27 de março de 2012


O pai nosso nos abandonou,
A Ave Maria é monótona,
A caridade um mau espirito
Só restou a feroz batalha terrestre
Sangrenta e nobre como a dos espíritos.
Tenho um apetite pela fome
Não sou fantasma ou alma
Passo rápido como sombra ou espectro.
Alguns minutos atrás, enquanto eu estava saindo do bloco B da UEPG um homem estava diante da porta falando alto, dizendo que os vícios do céu estavam agora na Terra, que era vegetariano a mais de 40 anos...

Em meio a felicidade que senti ao ouvir ele contar isso, acabei agindo como um bom cidadão e da forma mais comum possível e ignorei o homem.

Engraçado que durante todo o caminho de volta, em uma mistura de culpa e orgulho, na minha cabeça uma frase soava como o som pesado de um sino que dobra para anunciar as horas:

"A honestidade de mendigar, me aflige."

Rimbaud

Senti o dessabor da liberdade. Notei novamente (ou viajei esquizo?) o quanto escravo sou, enquanto liberto. Não tive os tostões da coragem para falar com aquele homem. Não consegui entende-lo. Fiquei exasperado.

"A honestidade de mendigar, me aflige."
"A honradez da da mendicidade exaspera-me"
"L'honnêteté de la mendicité me navre."

E como no poema de Hans Magnus Enzenberge, Hotel Fraternité:

"Meu inimigo
Debruçado sobre o balcão
Na cama em cima do armário
No chão por toda parte
Agachado
Olhos fixos em mim
Meu irmão"
Sou escravo enquanto liberto.

Meu inimigo


O que havia começado,
Como um pequeno exercício,
Hoje me faz de condenado,
Pois acabou se tornando um pesado ofício

Em uma das mãos carrego desesperos.
Na outra sufoco as tristezas.
Mas quando olho bem,
Vejo o quanto de vida e felicidade há em nelas.

sábado, 24 de março de 2012

No meu túmulo não quero a eternidade do epitáfio
Quero a das flores, muitas rosas
Margens das existências
E para que durem a minha na eternidade
Quero que sejam rosas de ferro. 

quarta-feira, 21 de março de 2012

Antes
Só com cores eu fazia.
Hoje, se possível eu pintava,
Até com espirro de alergia. 
Uma coisa que aparece,
Alguém odiando a espécie.

E espécime,
É coisa de umbigo.
Só to dizendo, partindo,
De qualquer livro lido.

Eu até que entendo. Sem sacralidade...
Do que eu li
Nunca encontrei livro ou papel ruim.
Seja A4, seda, eucalipto ou capim,
Pois palavra alguma foi escrita com ou no marfim
 

terça-feira, 13 de março de 2012

Quando consegui
Que houvesse silêncio em mim
Notei-me arrogante e pedi
Para o mundo também ficar quieto
Quando me calei por inteiro
E poucas boas noites de sono vieram,
Finalmente eu ouvi as lamúrias
Que eram nebulosas e inaudíveis
Pelo estrépito do espirito

Essas doses, hoje tão ausentes
Construíam um suporte
Pois quando me deti
Vi o suporte
Que haviam em mim
Sempre será um riso
Gargalhada do idiota
Mas os ouvidos só serão abertos
Para poucas bocas

Demônio vaidoso
Bastardo dos meus terrores
Filho de cenho luzidio
Por sonhos e pesadelos
Vai embora e deixa para mim
Somente o sono
Descanso frugal
Já que contei as estrelas
E contei por tanto tempo
Do que eu fazia
Desenhei números na minha testa
Cometi descasos com o infinito
Sem saber do infinito que há em mim

Ofereço uma taça do vinho mais tórrido
Ardente de sabores e capaz de embriagar
Com seu cheiro
Cultivado com uvas verborrágicas
E envelhecido nas vinícolas de ardentes paixões
Fico torpe com próprias nervosidades
Pois se as ardências do vinho, provem de sua cor
Eu já deveria saber que meu sangue sempre fora
Da cor mais rubra e corria nas veias mais dilatadas
Mas nunca fui o melhor ou o pior por isso
Sempre fui algo que nunca soube ser

domingo, 26 de fevereiro de 2012

O teto veste 
Uma camisa cor de tempestade
Azul escuro, chumbo anilado
Talvez fica nu de seu algodão

Do céu sem gotas
Seco como a garganta
A pluma cai, dançando sinistramente
Vem e vai
E com ela, outras mil
Tornando o chão grosso travesseiro

Ou então
Um chão colchão
Macio e confortável
Claro e repugnante

Assim um poeta
Além de criador,
Escultor da vida e do pensamento
É antes de mais nada um covarde

Um efémero das felicidades
Um cultivador da tristeza
E só se arma, as vezes herói
Quando empunha uma pena

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Prece para um poeta


 Fui para a guerra, coroado com cicatrizes, machucados, cortes, ferimentos sufocados, o sangue marcava os curativos. É um cão, animal dividido, cortado e com os nervos a mostra. Sofre e cospe tudo que tem de impuro. Não está salvo, o interior é sujo e retorcido. Agora te deita e adormece rodeado das papoulas e reina com o teu próprio sono.

Se me lembro bem, as cápsulas são de veneno, carregam pequenos infernos, doses em oitavas e que regem o coro das reações. Cozinham-me o corpo, os órgãos e marcam o sabor, tatuam na língua um gosto áspero, amargo e que parece ser o trilhar da cura, o préstito para as minhas contaminações.

Assim, me recordo de um sujeito, e como estupefatam suas palavras, folego custoso e que descanso meus olhos, levanto o cenho, admirado e com fundos de inveja. Com os teus 21 anos foi um maior, vencedor e com um triunfo perdido. Foi idolatra dos que havia de desdenhar, foi um baluarte, carregava a bandeira da vil tropa que caminha sobre a Terra. Infante da língua, fez terríveis, sofríveis e maravilhosas experimentações. Fez alquimias, troça e desconcerto com as filosofias, que no Ocidente são desagradáveis e tocantes no Oriente. O que fazem da mente os homens?

Pois bebi das tuas palavras, do teu cerne, absorvi o sangue das entranhas, Roubei teus estilos mas ainda tento compreender as vidas, as criatividades e uma morte prematura, pois foi embora, pequeno, pérfido e ardiloso Rimbaud. O Arthur, maior do que um rei, maior que os reis.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

E se o chão fosse também um teto!?
E porque só nomear as cores,
Com as 26 letras do alfabeto?


E quanto aos sentidos,
De oh, tão completos,
Ainda não dizem
De tudo?

Esse tal de tudo
É tanta coisa!?

Qual o sabor da cor?
E o odor da dor?
Que gosto tem o vermelho?
E qual sabor tem o amarelo?

sábado, 28 de janeiro de 2012

Culatra


Não que alça pinças
Como se fossem asas infames
Esmague o crânio e faça grão e cinza
Das contas do teu rosário
Ore por dores de cabeça, aflições
Para sofrer no cotidiano do calvário

Vinga com estrépido silencioso
E honra os antepassados com sonoras letras
O dia já pede adeus e a noite abraça
Junto a um manto negro
Sequioso pelas manhãs
E pelos amanhãs, estas,
Doces ilusões de abrangência estúpida
Mas que mantém a espinha ereta
Atrevido digo que todos nascemos no palco
de uma Vaudeville belamente decrepita

Qual o sentido de tanto amor com o oceano?
Temor de ter a ele como inimigo?
Sem falta, é na menor oportunidade
Que ele engole quando diz seu amigo
E todos os barcos, imponentes caravelas
Com minusculos marinheiros
Arriscam-se no mar, como a luz da vela
Bruxuleante sob o luar
Pois enquanto queima, a pergunta que faz
Vai desde saber a força da luz que tem sob a Lua,
Ou da fraqueza que demonstra por resistir aos ventos
Fortes e que não se detêm dentro da rua

Tragam um lenço,
Ou injetem morfina
Anestésico de meu abdômen
Tudo que escrevo
Do rastilho de pólvora
A trilha de pó
é onde vomitar dores
Embarco sobre o Lete
E tomo das águas
Esquecido, reencarno
Vazio, entendiado
Derretido sobre a culatra

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Colon

E se eu gestasse
Nas entranhas
Nas vísceras
O filho de um demônio

Nascido em minha defesa
Muralha orgânica
Como um escudo cravado de heráldica

Invade um castelo sem rochas
Azedo pela carne
Sob a ponte e dentro do fosso
Afogam-se leviatãs
Mas sufocam ante o préstito
Os mais terríveis e temíveis monstros

Nas face de cada
As sinfonias das tristezas, solitários
Monstruosidades
Flagelam-se e desfiguram a própria cara
Buscam rebelar-se do incomodo bastardo
Filho por momentos desgraçado

Ouça e sintam as erupções
A lava de intensidade que escorre
Arde, queima e lacera os ouvidos
Notas compostas de uma extrema e
Irreversível tensão

De um zero apareceu
De um zero sempre há de aparecer
De um zero tem de sempre iniciar
Tal arte, artista
Transubstancia um coração
E a alma
E assim faz música
Poesia, conto
Do espirito uma reverberação
Grossa, odiosa
Mas sempre graciosa
De uma livida expressão

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

No fundo, toda bosta ja foi uma comida gostosa...


Texto feito em conjunto com a Juliana Baerhttp://www.facebook.com/juhbaer 


Para contextualizar, isso tudo foi escrito em um mural do facebook, onde fomos compartilhando várias ideias e historias comuns a ambos.


Na pequena mesa de um bar...


É uma lógica muito boa e faz bastante sentido. Mas para você ver como a gente que fode. Culpa da digestão que nosso organismo faz hahaha
E você tá muito bukowski ou esses autores lixo que viviam podres no meio fio ou fodidos na calada da noite bebendo uma dose forte de qualquer coisa, maços e mais maços de cigarro e uma caneta escrota sobre um papel molhado pela bebida onde você tenta esconder as maiores perspicácias da mente.

Me sentindo como se fosse uma poeta da segunda geração do romantismo... "Mal do século, boemia e cheia de vícios" vou começar escrever nos guardanapos engordurados, enquanto ainda bebada retiro os fiapos de frango do meu dente... boca podre, fedendo a cigarro, cachaça, risóles nada fresco do bar... paro, reflito um pouco, e peço um aperitivo de ovos de codorna, e continuo a observar, desejar e escrever... vou fazer isso sexta feira... motor breath, aguarde a minha decadência.

Posso aparecer lá então!? Quero ver isso em uma banqueta ao seu lado, com total sobriedade. Os olhos da curiosidade repousam sobre a personificação da decadência. A criatividade ebulindo com os teus sentimentos de ruína.
Eu negaria os pedaços de frango, mas aprecio umas doses de bebida enquanto reclamo do cheiro forte de cigarro que fica impregnado por entre os dedos e na malha barata da camiseta.

O atendente com um olhar não muito amigável serve mais uma dose de bebida naquele copo enquanto a boca da garrafa começa a ficar mergulhada e refratada dentro da textura grossa daquela dose forte que não sabemos se é vodca, cachaça ou o mais puro álcool.
Não importa, cada gole, cada dose e cada palavra são formas de suportar algo muito maior, mais forte e mais pesado do que as presenças no bar ou a ressaca de um dia seguinte.
E, quando voce sentar do meu lado, vou fazer questao que beba... e fique tao bebado quanto eu pra que desenvolvamos a sintonia da alegria forçada... começaremos a rir alto, falar alto e chamar atençao de todos que estiverem dentro daquele lugar... lamberei meus dedos, acenderei um cigarro, escreverei o começo e compartilharei com voce aquele papel imundo, com palavras imundas... Será a sua vez de escrever, o que lhe vier a mente... raivas, ódios, medos, alegrias, surpresas, até obviedades... e quando toda a criatividade se esgotar, ou se alguem interromper e interferir na nossa jogatina poética, lançaremos aquele papel no lixo, e voltaremos a conversar sobre as futilidades da vida, essas que a gente perde parte da vida correndo atras, se humilhando e sendo escravo... Te oferecerei um cigarro, e mesmo voce reclamando do cheiro insuportavel que fica entre os dedos, e da falta de ar que esse veneno te causa, voce vai aceitar... Observaremos a fumaça e os monstros que ela forma, provavelmente será tarde, te darei um longo abraço, e pegarei carona com um desconhecido.

Enquanto eu tomo o primeiro gole e você começa a chamar a atenção, eu acabo por te repreender, meio puto, gosto da discrição e sob a desculpa de ser teu amigo ambos não ficamos chateados com isso. A alegria não parece mais forçada depois de muito álcool.
Por causa de onde estou não conseguirei pensar muito e as únicas anotações que farei no papel serão sobre o local, alguma lembrança, um desgosto e uma raiva retida em torno do meu pai. Após você jogar o papel fora, eu, em segredo vou apanhar ele de novo, com um certo desdém pois ele já está recoberto de cinzas de cigarro, gordura e um pouco do pó que havia no chão. Você olhará para o relógio e dirá que está na hora de partir. Um pouco tomado pelo sono e da bebida eu concordo. Depois de um abraço seu, você pega carona com um desconhecido. Antes de você sair eu te falo para da próxima vez procurarmos um local com mais classe. Uma espelunca com classe. Você vai retrucar dizendo que espeluncas não precisam de classe, eu provavelmente diga que elas tem, mas a gente não nota. Você discorda novamente e ficamos por isso mesmo, a discussão não tem fundamento e levaria a lugar nenhum. Te peço mais um cigarro para acompanhar a volta para casa. Enquanto fumo ele e caminho por entre as acidentadas calçadas e nas pequenas poças que se formaram entre as pedras quebradas e o concreto sujo.Chafurdei nas minhas próprias ideias e notei que elas se tornaram meu maior vicio. As ideias e as palavras me são viciantes. Volto a mim e me dou conta da preocupação em torno da carona que você pegou, mas você é bem grandinha e supostamente deve saber o que faz.Durante o trecho até minha casa vejo algumas putas nas esquina fumando uma pedra de crack, já é fim de noite e a clientela já deve estar em casa para voltar a mais um dia de trabalho, em seus escritórios, cuidado de algum filho, vendendo algum titulo, arquitetando algum projeto. Passo apressado perto delas e evito a troca de olhares. Apalpo os bolsos em busca dos meus pertences; celular, carteira e chaves. Tudo aqui. Tiro as chave e brinco um pouco com elas e com o chaveiro, faço do último um anel no dedo indicador e fico girando-o como se eu tivesse grandes habilidades e me sinto o máximo por isso.

Sempre soube que você adora estar escondido entre a multidão, e que chamar atenção nao faz o seu tipo... Mas há certos momentos na vida de uma mulher, que ela precisa disso... Ser vista e desejada... Ainda mais quando os anos vão passando e seu corpo está com a gordura acumulada de todos os anos, desde que nasceu... Principalmente quando surge aquelas princesinhas mais bonitas que você ja foi um dia... Se chama atenção pelo riso, pelo olhar, pela inteligencia, até mesmo por gargalhadas forçadas... No fundo, sei que faz parte do seu ciuminho 'paternal', dou uma risada interna aprovando a sua repreendida, abaixo o volume da minha vitrola... Observando sempre, aquele rapaz do canto direito, bebendo sua cerveja e esperando a próxima vítima... Nada sei, a respeito do seu pai, você é tao timido e guarda tantos segredos... Não que voce queira fazer o tipo misterioso, mas eu sinto a sua dor, de alguma forma... Eu nao forço, mas começo a imaginar os seus traumas... Imaginar você pequeno, aprendendo a falar, subindo na árvore, a sua primeira descoberta feminina, escondidos em algum comodo da casa de algum parente, provavelmente com alguma prima... Ah, infância... como passamos situações tão semelhantes... paro, e lembro me da minha... Quantos homens já chamei de pai... Paro, e sei que devo parar de pensar sobre isso... Mesmo sabendo que isso é irrelevante na minha vida de hoje, eu sei que o inconsciente não perdoa... Contos de família em uma pocilga de bar?! Tenha dó... Quando percebo, bendita visão periférica, o rapaz que citei, estava me olhando... retribuo o olhar e sem querer faço um sorriso de cachorra... Definitivamente nao sei só trocar olhares... o sorriso cretino é intrínseco nas minhas paqueradas... Me dou conta que ele gostou, observo em cima do balcão... Uma chave e um capacete... Possibilidade de conseguir carona... me animo e tomo mais um gole daquela dose nervosa... olho pra você, e você ainda esta escrevendo... Nao escreveu muito, até porque tudo isso aconteceu em menos de um minuto...
Como o previsto, o rapaz nao se aguenta.

Sou uma das únicas mulheres solteiras e disponíveis no bar, pergunta meu nome, e começamos a conversar... aquele papo bem ridículo, mesclado com a timidez, vergonha e tudo que repreende a nossa fera interior... você já está sacudo, começa a me olhar torto, tento te incluir de todas as formas na nossa conversa... Voce nao aceita, porque nao é burro... Não tem mais idade pra perder tempo com esses papos sem sentido, e completamente desnecessários... voce e eu sabemos qual é o objetivo dele... Conversar e escrever poesia certamente que nao é... Peço licença pro rapaz, ambos olhamos o relógio... te dou o cigarro e um abraço... você segue apé... e eu ganhei uma carona de um completo desconhecido... Fico pensando na loucura que pode parecer... sorrio, e fico feliz por ser louca... Fico feliz por nao ter medo, e confiar nas pessoas intuitivamente... Ele me convida pra ir ao motel, eu já estou muito bebada, e mando me deixar em casa. Quando me dou conta, eu estou em casa, e com ele... Dou alguns beijos pra valer a noite, e, quando sinto que os hormonios começam a esquentar viro pro canto e durmo... Sou egoista e louca... E adoro.

Uma unica coisa, me arrependo da noite, você foi com a intenção de ficar sóbrio e observar a minha decadência... Infelizmente ela tomou conta de voce também... nao sei se é a energia do ambiente, ou se no fundo você também estava precisando disso... pego o telefone pra re ligar, mas tenho certeza que você ainda está dormindo... Nao quero te incomodar... O equilíbrio é algo tão ingrato... voce pode morrer com suas fórmulas de reforma intima, seus segredos de como manter-se lúcido, tomar seus chás de camomila e todos os anti depressivos que você consiga receita... mas quando a vida resolve te derrubar, amigo... prepare-se ou aproveite... percebo que o rapaz foi embora... Nem pude agradecer a carona...